quarta-feira, 16 de abril de 2014

Promessas Falhadas



Os números romanos flutuantes na minha parede controlam o meu corpo, os meus movimentos. Arrastam-me para a rotina, mas não controlam os meus pensamentos. As engrenagens soam como um aviso e os meus olhos insistem em juntar os cílios, mas eu não consigo parar de pensar na cor do céu da sua última noite de novembro e do quanto eu desejei escrever para você. De certa forma eu já sabia que seria a única e a última carta. Tentei de todas as formas te escrever promessas, mesmo que a maioria não fossem cumpridas, tentei dizer mais uma vez o quanto eu a amava.
Lembro-me de que o castanho do meu olhar fitava a casa a procura de qualquer maneira de te escrever. Mas eu nada encontrei. E continuo odiando aquela relíquia no canto da sala, uma velha máquina de escrever com letras faltantes que fizeram minhas promessas falhadas. Mas eu odeio menos a máquina do que a mim, que deixei falhas na minha memória: falta de sorrisos seus.
Os ponteiros agora parecem cintilar mais alto em meus ouvidos, é hora de dormir. Porém continuo me recordado de cada palavra que pensei em te dizer. Em cada promessa tão planejada. Eu largaria os relatórios de domingo e te levaria para viajar. Eu desmarcaria os compromissos em pleno dia de semana e fugiria com você, desligaria o celular e fecharia a agenda e seria só seu naquela segunda feira de sol ou chuvosa. Eu prometi de todas as coisas do mundo sempre escolher você e estar com você, tomando água ou vinho. Eu construiria uma nova casa, e pintaria da sua cor favorita. Compraria também aquela porcelana que vi você namorar pela vitrine. Prometi também tentar não chegar sem avisar e te ver toda vestida de branco na sala.
Prometi que trabalharia menos e que cuidaria mais de você. Prometi que te levaria para ver sua peça favorita e dormiria ao seu lado sem hora para acordar, que tentaria trocar sempre que possível o terno e gravata por uma bermuda e te ajudar a cuidar do jardim.
E enquanto eu pensava em como te fazer feliz o tempo foi passando, a agenda acumulando e você foi se apagando dos meus dias. Quando me dei conta os cinco minutos a mais focados na rotina se tornaram dez, vinte minutos... E naquele dia, olhei pela janela o céu e me lembrei de como você adorava os rabiscos do sol se despedindo e senti saudade do seu cheiro e da sua voz. Então decidi que passaria mais tempo com você e prometeria tudo que deixei de fazer por você e com você.
Naquela noite posicionei-me rapidamente de frente para a máquina e não consegui escrever, não consegui completar tudo que eu sempre quis te dizer e não falei.
A ira fora quebrada pelo toque do celular, uma ligação que fez meu mundo desabar. E o céu nunca mais foi o mesmo, mas sinto você quando olho para ele.
Já não escuto mais o relógio da parede, a cidade permanece em silêncio e minha mente barulhenta, o passado tem me visitado com frequência...
Hoje vou dormir com a janela aberta.

Sabrina Stolle